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História do Jardim Botânico da Ajuda
“Jardim do século XVIII, final do barroco, espaço de rigor geométrico, foi o primeiro jardim botânico português, devendo ser considerado como a primeira e a mais importante instituição dedicada à cultura da história natural do País.
Após o terramoto de 1 de Novembro de 1755, o Marquês de Pombal mandara construir na Ajuda, nessa época subúrbio da capital, um edifício de madeira, abrigo e residência provisória da família real, que ficou conhecido pelo nome de «Paço Velho», e que, no reinado de D. Maria I, desapareceu devido a um incêndio. Para implantação do Real Jardim Botânico, no sítio de Nossa Senhora da Ajuda, D. José I comprou ao conde da Ponte a quinta que este possuía junto ao Paço da Ajuda. Inicialmente esta quinta destinou-se à cultura de frutas e hortaliças necessárias ao palácio real.
Por influência de Miguel Franzini, professor dos príncipes D. José e D. João, netos do rei e filhos da que viria posteriormente a subir ao trono com o nome de D. Maria I, foi projectado o 15.º Jardim Botânico da Europa.
Em 1765, por ordem de D. José, foi encarregado de delinear e dirigir as obras do Real Jardim Botânico da Ajuda o Dr. Domingos Vandelli e de as inspeccionar o ministro da Marinha, Francisco Xavier de Carvalho, irmão do 1.º Marquês de Pombal. Destinava-se o jardim, tal como o Museu de História Natural e o Gabinete de Física, instalados num edifício próximo, à educação dos príncipes, em particular a D. José, então com 15 anos e destinado a suceder a sua mãe, caso não tivesse falecido.
Na Europa, tal como anteriormente se mencionou, já desde 1543 se vinham a construir jardins botânicos destinados a instruir todos os que quisessem estudar os enigmas do mundo vegetal, podendo citar-se, nomeadamente, os de Pisa, Pádua, Bolonha, Montpellier, Estrasburgo, Paris e Madrid.
Vandelli, em 1791, após ter sido jubilado da Universidade de Coimbra, foi nomeado director do inicialmente denominado «Real Jardim Botânico da Ajuda, Laboratório Químico, Museu de História Natural e Casa do Risco». Mandou vir plantas vivas e sementes dos jardins botânicos de todo o mundo, chegando a coleccionar mais de 5000 espécies. No entanto, em finais do século XVIII, apenas existiam 1200 espécies em cultura: a administração do mestre jardineiro Júlio Mattiazi, que Vandelli mandara vir de Pádua, tinha privilegiado as obras e descurado a conservação dos espécimes.
Vandelli seguia o sistema natural de Lineu da edição de Murray para classificar as plantas; no início da sua actividade como director do jardim foi-lhe muito dedicado, no entanto, no final deixou-o decair. Por morte de Francisco Xavier de Carvalho, foi o inspector-geral do jardim, Martinho de Mello, que mandou construir duas estufas destinadas a plantas exóticas, promoveu a cultura de plantas úteis, mandou vir do Brasil, Angola e Cabo Verde muitas plantas e remeteu para o Jardim Botânico da Universidade de Coimbra muitas sementes. Foi neste período, e por ordem do rei D. João VI, que o jardim e o museu foram abertos ao público. Todas as quintas feiras, desde que não coincidisse com dias santos, podiam ser visitados. A este inspector sucedeu o marquês de Ponte de Lima. Durante o período da responsabilidade deste último, o número de espécies existentes aumentou devido ao incremento das ofertas pelos governadores das colónias.
O segundo director, Félix de Avellar Brotero, também após ter sido jubilado da Universidade de Coimbra, fez reviver o jardim. Na opinião deste ilustre botânico, iniciador dos estudos de botânica taxonómica, que em 1811 foi empossado como administrador e director, a instituição que lhe tinha sido confiada, apesar de nela se encontrarem muitas plantas raras e úteis em medicina, agricultura e arte, tinha sido estabelecida sem rigor científico. O País tinha sofrido as invasões francesas e as verbas para a manutenção e progresso do jardim tinham sido retiradas. Brotero, que permaneceu até 1828 como director do Jardim Botânico da Ajuda, com os recursos que possuía introduziu os melhoramentos que pôde, inclusive uma fonte no bosque, muita apreciada pelo próprio rei D. João VI, o qual, num passeio ao jardim, após ter regressado ao Reino, recomendou a Brotero que a conservasse, por ter achado a água muito fresca.
Durante o período da administração do Brotero foram cultivadas muitas plantas, no entanto, na opinião do Dr. José Sanctos do Valle (terceiro director), nunca por ordem sistemática. O catálogo das plantas em cultura da autoria de Brotero regista 1370 espécies.
Após a morte de Brotero, o Jardim da Ajuda passou por uma fase de decadência; o longo período da usurpação e a substituição do seu director levaram quase à sua total ruína.
Em 23 de Maio de 1834 foi nomeado director, por decreto de D. Pedro IV, o Dr. José de Sá Ferreira e Sanctos do Valle, lente da Faculdade de Filosofia da Universidade de Coimbra, cargo que desempenhou apenas durante dois anos. Posteriormente, o Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda, por decreto de 27 de Agosto de 1836, foi confiado à administração da Academia das Ciências.
Quando, em Janeiro de 1837, a Escola Politécnica foi instituída, foi reconhecido ser indispensável a existência de um jardim botânico, o que não podia ser improvisado de um momento para o outro, pelo que, em Outubro de 1838, Xavier de Almeida, professor da 8ª cadeira (Anatomia e Fisiologia Comparadas e Zoologia) do curso de Introdução à História Natural dos Três Reinos, foi encarregado provisoriamente do ensino da Botânica e da administração do Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda. A partir de Novembro de 1838 os dois estabelecimentos passaram a ficar incorporados na Escola Politécnica.
Em Junho de 1839, o ministro dos Negócios do Reino concordou com a incorporação do Jardim Botânico na Escola Politécnica, mas não com a entrega do Museu de História Natural. No mês seguinte a direcção científica do Jardim Botânico era confiada ao lente da 9ª cadeira (Botânica e Princípios de Agricultura), no entanto, no primeiro concurso destinado à escolha de professor para a referida cadeira decidira-se a exclusão do único candidato, o Dr. José Maria Grande, pelo que o Prof. Xavier de Almeida desempenhou na interinidade as funções de director. Após uma segunda votação ordenada pela rainha, D. Maria II, o Dr. José Maria Grande foi aprovado lente da 9ª cadeira e, consequentemente, director efectivo do Jardim Botânico a partir de Julho de 1840.
O célebre botânico austríaco Friedrich Welwitsch encontrava-se em Portugal desde Julho de 1839, a fim de efectuar uma viagem de estudo aos Açores, Canárias e Cabo Verde subsidiada pela “Unio Itineraria”, associação com sede em Essligen, cujo objectivo era proporcionar a realização de expedições científicas. No entanto, devido às tempestades, as viagens entre Lisboa e as ilhas tornaram-se irregulares, o que teve como consequência Welwitsch não ter prosseguido além de Lisboa e ter apresentado uma pretensão na Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra para ser nomeado preparador de Botânica na Escola Politécnica. Não estando previsto o cargo de preparador ou demonstrador para a 9ª cadeira, e após o falecimento do mestre do Jardim da Ajuda, foi decidido pelo conselho escolar que se contratasse o Dr. Friedrich Welwitsch como conservador dos estabelecimentos botânicos da escola. Em Dezembro de 1840, o próprio primeiro-ministro, o duque de Palmela, confiou-lhe o lugar de director do Jardim Botânico. Durante a curta permanência do distinto naturalista, muitas espécies novas, muitas delas exóticas, foram enriquecendo o jardim. No final de 1844 Welwitsch já exercia as funções de orientador do Jardim do Lumiar, anteriormente adquirido pelo duque de Palmela, bem como a superintendência de outros jardins que o duque possuía dispersos por diversos pontos do País.
Em 1848, o Prof. Dr. J.M. Grande procurou melhorar as colecções de vegetais em cultura e, tendo entregue o ensino durante alguns dias ao seu substituto, o Prof. Andrade Corvo, concluiu as determinações das plantas ainda não identificadas.
Também o Prof. e Conselheiro João de Andrade Corvo e o Prof. Conde de Ficalho se esforçaram por fazer melhorar o jardim, tentando a sua utilização para o ensino e o seu embelezamento.
Quando, em 1868, Glasnevin, director da Real Associação Botânica de Dublin, visitou Portugal, descreveu do seguinte modo a sua opinião sobre o Jardim Botânico da Ajuda: “Em parte do jardim estão as plantas classificadas segundo o sistema de Lineu, mas em outra parte tivemos o prazer de ver escrita a indicação de que na disposição das plantas se seguiam ali as Ordines Naturales Systematis Lindley. Na era presente interessa examinar aquele antigo jardim, que fornece um dos melhores exemplos que podem encontrar-se do que foram os jardins botânicos no século XVI e parte do XVII. As suas estufas, que são bem poucas, têm igualmente uma construção antiquada, estando bastante vazias no tempo em que as visitámos. As melhores plantas eram as que vimos plantadas em pleno ar, e entre elas notámos com especialidade a Araucaria excelsa, Ficus elastica, Lagerstroemia indica, Pittosporum tobira e Pittosporum undulatum, medindo de altura uns 20 pés e perfeitamente cobertos de semente[…]”.
Em 1874 o jardim foi entregue à administração da casa real, tendo decaído progressivamente. No tempo de D. Luís foi mandada edificar a estufa das orquídeas, sob a direcção de D. Luís de Mello Breyner, director da Real Associação Central da Agricultura Portuguesa. A partir daí sucederam-se várias direcções, até que foi entregue ao Instituto Superior de Agronomia, em 1910. Neste ano o Prof. Rasteiro fez a reconstituição do tabuleiro inferior, dando-lhe o mesmo aspecto que já se observava na planta de 1869.
Em 1934, sob a direcção do Prof. André Navarro, ocorreram benefícios importantes e foi também nesta data que o Prof. Caldeira Cabral estabeleceu o traçado dos canteiros do tabuleiro superior, que se tinha perdido completamente.
Em 1975 e 1976, uma comissão de gestão dirigiu o jardim. Desta comissão fazia parte um elemento do Gabinete de Botânica, outro da Secção de Arquitectura Paisagista e outro da Secção de Construções Rurais. Durante este período actualizou-se a identificação de mais de 100 espécies de plantas ornamentais cultivadas no jardim e este serviu de apoio ao ensino e investigação em floricultura.”
Caixinhas, L. (1991). História dos Jardins botânicos de Portugal.
In: Menzel-Teltenborn, H. et al., Botânica 2. Círculo de Leitores e Bertelsmann Lexikothek Verlag GmbH: 170-174.
Entre 1993 e 1997, com o apoio do Prémio de Conservação do Património Europeu e do Fundo de Turismo, sob a orientação da Profª. Cristina Castel-Branco, procedeu-se a um restauro do Jardim com a recuperação da colecção botânica, o restauro do sistema de rega e a instalação do Jardim dos Aromas.